Angela Hirata, uma executiva sem fronteiras.
Os tradicionais chinelos Havaianas ganharam o mundo com ares fashion após a entrada dessa profissional nikkei na São Paulo Alpargatas. Seus atuais três passaportes já não dão conta das viagens que Angela Tamiko Hirata faz para divulgar os produtos da São Paulo Alpargatas, especialmente as Havaianas.
“Cheguei a ter mais de um milhão de milhas”, conta a diretora de comércio exterior. São 63 países onde as pessoas desfilam com as legítimas sandálias de borracha brasileiras, graças ao trabalho dessa nissei nascida em Rosária, interior de São Paulo, e formada em Administração de Empresas pela Universidade de São Paulo (USP). Graças ao trabalho de Angela e sua equipe, o chinelo criado em 1962 ganhou ares fashion e conquistou clientes que chegam a pagar US$ 250 lá fora por um exemplar com cristais Swarowski. Na Austrália, por exemplo, 8 entre 10 pessoas possuem um par de “Havies”, cujo par mais tradicional custa US$ 10 ou 25 euros. A revolução da marca começou com a criação do departamento de comércio exterior em 2000 e a contratação de Angela para dirigi-lo. Até então, as vendas para o exterior eram esparsas, não havia um movimento articulado em direção a esse mercado.
A decisão de explorar as Havaianas deu-se pelo fato de ser um produto tipicamente brasileiro, colorido, e sem concorrência interna ou externa. A executiva montou parcerias com distribuidores e representantes locais que souberam posicionar a marca e mostrar o alto valor agregado das sandálias de dedo junto a celebridades de Hollywood, estilistas e formadores de opinião. “O respeito às diferenças culturais é o segredo do sucesso do nosso produto”, afirma Angela, que fala fluentemente japonês, além de inglês, espanhol e italiano. “Cada país tem suas preferências, alguns preferem determinadas cores, com salto ou sem salto, você tem que avaliar muito o mercado”, pondera. “É preciso estar atento às oportunidades que surgem; se não estiver atento a isso, você não consegue fazer bons negócios”, frisa. “E para fazer bons negócios é preciso ter razão, sensibilidade e emoção”, defende.
Angela tomou gosto pelo marketing quando ainda cursava a faculdade. Nessa época, trabalhou com o lançamento de franquias no Brasil. “Apesar da minha formação em administração, comecei a tomar gosto por marketing, promoção e desenvolvimento”, lembra. Ela começou a ser procurada para trabalhos free lance na área, o que acabou provocando sua saída da empresa onde trabalhava. Dessa forma, passou a prestar serviços para Levi´s, Hering e Boticário e foi aumentando sua carteira de clientes até começar a trabalhar o lançamento da Couromoda, promotora de eventos de calçados e acessórios, em São Paulo, por volta de 1985. Nessa época, começou também seu envolvimento com a indústria de calçados.
Em 1986, veio a grande oportunidade para Angela. O então dono da Azaléia, Nestor de Paula, convidou-a para desenvolver o mercado japonês e asiático do setor calçadista. “Começou aí um desafio e minha trajetória de viagens ao Japão, que durou dois anos”, afirma. É sabido que não é nada fácil entrar no mercado japonês. Mas, por ter conhecido o estilista Kansai Yamamoto e a reitora do Bunka Fashion College, Angela tomou contato com entidades e empresas japonesas, especialmente com o empresário Yasuhiro Kubota, e as portas foram se abrindo. Começou a enviar calçados brasileiros para grandes lojas, como Washington Shoes e Yoshinoya. “No Japão, não é simplesmente trazer um produto, é preciso uma moda que agregue valor a ele”, diz. A partir de então, a executiva passou a ampliar o mercado asiático.
No final da década de 80, Nestor de Paula e Kasuhiro Kubota montaram uma empresa de comércio exterior de calçados no Rio Grande do Sul e convidaram a executiva a presidi-la. Nos sete anos em que ficou, Angela trouxe missões de federações para o Brasil e levou empresários brasileiros da cadeia produtiva calçadista para o Japão. “Existe um provérbio japonês que diz: é melhor ver uma vez do que ouvir cem vezes”, diz. Dessa forma, foram enviados técnicos para conhecerem o que os japoneses chamavam de qualidade em calçados. Angela passou a desenvolver trabalhos nos Estados Unidos para marcas como Ann Taylor, Anne Klein, Banana Republic e conseguiu trazer a produção de calçados dessas marcas para o Brasil. Atuou também na Itália.
Sua trajetória de sucesso deve-se, em parte, a visão de seu pai. “Meu avô era um bom negociante, meu pai sempre foi muito arrojado e ele sempre dizia assim: ‘vocês não tem que ficar se prendendo somente na vida dentro da colônia, vocês são brasileiros e têm de seguir a vida de vocês, sair dessa redoma. Vocês têm que conhecer nossa cultura, saber suas origens, isso é muito importante, mas não ficar preso na colônia japonesa”, conta Angela, que tem 12 irmãos. Aos 14 anos, foi para um colégio interno em São Paulo. Foi recepcionista aos 18 anos, depois trabalhou em uma editora chilena e também no Diners Club. Sem afetação, Angela prefere não dizer a idade. “Já passei da metade do século”, brinca. Divorciada, tem dois filhos: Emerson Shiromaru, 33, e Lincoln Shiromaru, 25. Como o próprio passaporte denuncia, ela passa 50% do tempo viajando, mas sempre encontra tempo para almoços de domingo com o pai, Takeo Hirata, 85, aqui no Brasil, e para cultivar seu relacionamento de 15 anos com um empresário que mora no exterior. Sua mãe, Sumiyo, faleceu em maio deste ano. Nas horas vagas, gosta de cantar, caminhar e assistir filmes de mistério, no estilo Agatha Christie. “Filmes água com açúcar são muito previsíveis”, afirma. Angela também não dispensa uma boa estação de esqui. “Adoro esquiar, é um momento em que me esqueço de tudo”, ressalta.